Significado de Habeas Data


O que é Habeas Data



Como se sabe, com o passar do tempo, foram sendo criados instrumentos legais para proteger os cidadãos de erros ou atos arbitrários cometidos por agentes do Estado. Um desses instrumentos legais é chamado habeas data. Ele é de criação relativamente recente e é relativamente pouco conhecido pela população, que, de modo geral, desconhece sua história, seus usos e os procedimentos relativos a ele.

Conceito de habeas data

O habeas data é um remédio jurídico (meio legal também chamado remédio constitucional que permite ao indivíduo solicitar que intervenha autoridade competente para reparar ou prevenir abuso de poder, ilegalidade ou lesão ao direito - entre os remédios jurídicos, podem ser elencados o mandado de segurança e o habeas corpus) existente em alguns sistemas jurídicos (principalmente de países latino-americanos) relacionado a bancos de dados. Pode-se estabelecer uma analogia entre o habeas corpus e o habeas data.

O habeas corpus (cujo nome em latim significa "tenha o corpo" e é parte da expressão "habeas corpus ad subjiciendum", que significa "tenha/apresente o corpo sob sua guarda") é um remédio legal que permite que se desafie a limitação ilegal ou a ameaça de limitação ilegal do direito de ir e vir do cidadão. O habeas corpus é um importante instrumento no combate ao abuso de poder por agentes estatais e seu restabelecimento, em 1978, para os acusados de crimes políticos foi um dos marcos do processo de abertura que levou ao fim do regime militar que tinha sido instalado no país no ano de 1964.  

O habeas data (que significa "tenha a informação" e recebeu seu nome em analogia com o habeas corpus) é um recurso para a defesa da privacidade e da honra do indivíduo que permite o acesso a informações presentes em bancos dados de natureza pública e a retificação ou supressão de dados falsos que constem nesses bancos de dados.

José Eduardo Carreira Alvim chegou a incluir o habeas data (junto com o mandado de segurança e o habeas corpus) no que chamou de santíssima trindade das garantias do estado de direito.

História do habeas data

O habeas data é, como se afirmou acima, um remédio jurídico de criação relativamente recente: ele surgiu no final da década de 1980. Embora possam ser apontados precursores do direito a habeas data como legislações de proteção à privacidade europeias (por exemplo, os direitos assegurados pelas constituições de Portugal e da Espanha elaboradas na década de 1970 depois das quedas dos regimes ditatoriais desses países) e a Lei de Acesso à Informação (Freedom of Information Act) americana (que data da primeira metade da década de 1970), o habeas data é uma criação brasileira: ele foi instituído pelo inciso LXXII do artigo 5° da Constituição Federal, que foi promulgada no ano de 1988. Alguns outros países latino-americanos, como, por exemplo, Paraguai e Argentina, seguiram o exemplo brasileiro e incorporaram versões do habeas data a suas constituições.

Em seu artigo Habeas Data: The Latin-American Response to Data Protection, Andrés Guadamuz, atualmente professor da Universidade de Sussex, observou que o habeas data foi uma solução adotada pelos legisladores latino-americanos no período que se sucedeu à queda dos regimes militares que dominaram a América Latina entre os anos 1960 e 80. Essa solução visa à proteção da privacidade e da honra ameaçadas principalmente pela coleta e pelo armazenamento de dados em bancos de dados controlados pelo Estado. Michel Temer, professor de Direito e deputado federal (inclusive membro da Assembleia Nacional Constituinte que elaborou a Constituição de 1988) que chegou à presidência do Brasil depois da queda de Dilma Rousseff, de quem ele era vice, observou que o habeas data é uma reação a um ordenamento legal em que o governo tinha poder para - de forma secreta - arquivar, segundo seus próprios interesses e conveniências, dados relativos à conduta e às convicções dos indivíduos.

Arnoldo Wald e Rodrigo Fonseca também relacionam o habeas data à experiência do país com o regime autoritário instalado pelo golpe de 1964, mais especificamente com o Sistema Nacional de Informações (Sisni), banco de dados do governo coordenado pelo SNI (Serviço Nacional de Informações, órgão de inteligência que coordenava as ações de inteligência e contrainteligência do governo brasileiro). A adoção pela Constituição de 1988 do habeas data facilitou o acesso dos cidadãos aos dados do Sistema Nacional de Informações. Em editorial de 1987, ano imediatamente anterior ao da promulgação da Constituição, o jornal Folha de São Paulo reconheceu a utilidade do habeas data e considerou-o uma reação aos abusos cometidos pelos órgãos de informação do regime de 1964 e um limite à utilização antiética de informações. 

Segundo Guadamuz, pode-se considerar que o habeas data é uma evolução do sistema europeu de proteção da privacidade e que o habeas corpus, depois de seu surgimento no Brasil, tem continuado a evoluir, apresentando em cada novo país em que é adotado melhores proteções para a privacidade do indivíduo. Embora, provavelmente, não possa ser adotado em todos os países, Guadamuz observa que ele não cria novas burocracias como o modelo europeu e não deixa a defesa das informações ao sabor de arranjos autorregulatórios como o modelo americano, apresentando, assim, o que pode ser o melhor equilíbrio para os países em desenvolvimento, como os da América Latina.

O inciso LXXII do artigo 5° da Constituição Federal, que estabeleceu esse remédio jurídico, também estabeleceu o cabimento do habeas data. Segundo ele, o habeas data tem por finalidade garantir a quem o impetra o exercício do direito de saber que informações relacionadas à sua pessoa estão em bancos de dados de entidades governamentais ou públicas, sejam eles automatizados ou não, ou garantir que sejam retificadas informações falsas constantes nesses bancos de dados. A Lei Nº 9.507, de 12 de novembro de 1997, que regula o habeas data e seu rito, além de repetir as hipóteses anteriores, acrescentou outra função para esse remédio legal: assegurar a anotação nos assentamentos relativos ao interessado de contestação ou explicação que seja relativa a um fato possivelmente inexato - como aqueles que são objeto de pendência judicial, por exemplo.

Explica José Afonso da Silva que o habeas data resguarda a esfera íntima dos indivíduos contra o uso de dados pessoais coletados ilegal ou deslealmente, contra a introdução nos bancos dados de dados sensíveis (por exemplo, aqueles relativos a opiniões políticas, raça, orientação sexual, religião, etc.) e contra a permanência nesses bancos de dados de informações falsas ou usados com finalidades diferentes daquelas que a lei permite.

Conforme determina o inciso LXXVII do artigo 5º, a LXXVII), o habeas data é gratuito, ou seja, não se faz necessário pagar. Contudo, o habeas data precisa de advogado para ser impetrado.

Quem pode impetrar uma ação de habeas data

Segundo a Constituição e a Lei Nº 9.507, de 12 de novembro de 1997, é a pessoa titular dos dados em questão. De modo geral, o habeas data não é instrumento para aquisição ou retificação para de informações relativas a terceiros. Tem sido, porém, reconhecido o direito dos herdeiros e do cônjuge supérstite (ou seja, sobrevivente) de impetrar ação de habeas data. Autores como Paulo Lúcio Nogueira e Ives Gandra da Silva Martins defendem que apenas pessoas físicas podem lançar mão do habeas data. Outros autores, entre os quais pode ser mencionado Hely Lopes Meireles, defendem que também as pessoas jurídicas podem impetrar ação de habeas data.

Além de entidades estatais ou paraestatais, são abrangidos pela definição de bancos de dados de natureza pública, os bancos de dados de pessoas jurídicas privadas que possuam informações sobre as pessoas físicas ou jurídicas que sejam recolhidas de e fornecidas a terceiros sem que o titular dos dados saiba ou consinta (exemplo, SERASA).

Segundo súmula do Superior Tribunal de Justiça (STJ), cabe o habeas data apenas depois que o impetrante tenha solicitado ao órgão público responsável o acesso aos dados ou a correção dos dados inexatos. O órgão tem um prazo para decidir (10 dias no caso de ter sido requerido acesso às informações ou 15 dias caso se tenha requerido retificação de informações). Caso o pedido de acesso, retificação ou anotação tenha sido negado ou tenha decorrido o prazo estabelecido por lei sem decisão do órgão responsável, pode, então, ser impetrada ação de habeas data.

É possível ainda impetrar, em casos em que haja motivo justificar para temer infração dos direitos protegidos pelo habeas data, preventivamente ação de habeas data, o que permite inclusive que seja concedida medida liminar.

Entre as limitações para o uso do habeas data, deve-se elencar o fato de que ele pode ser negado em casos em que o sigilo seja fundamental para a defesa da sociedade e do Estado (embora, por se tratar o habeas data de remédio jurídico referente a dados personalíssimos, seja excepcional essa condição). Além disso, há jurisprudência que aponta que o habeas data não é meio aceitável para conseguir ter acesso a informações de processo correndo em segredo de justiça.

A princípio, o processo de habeas data que foi usado para conseguir acesso às informações do banco de dados pode ser usado também, em nova fase, para se pedir que se faça a retificação ou a anotação complementar cabível em vez de ser necessário impetrar novamente uma ação de habeas data.

Exemplo de habeas data

Um exemplo de habeas data é a ação impetrada pelos filhos de Tancredo Neves na Justiça Federal de Brasília com o objetivo de obter do Conselho Federal de Medicina e do Conselho Regional do Distrito Federal documentos tais como sindicâncias e depoimentos de médicos que tenham relação com o então presidente eleito, que acabou morrendo em abril de 1985. Tancredo Neves, que foi internado antes de conseguir tomar posse como primeiro presidente civil a ser eleito no pais em mais de 20 anos, acabou morrendo em condições nebulosas que, à época, deram origem a boatos e teorias conspiratórias. 

Pode-se encontrar em https://rosangelajuridico.wordpress.com/2016/02/25/habeas-data/ um modelo de habeas data que mutatis mutandis (ou seja mudando-se o que as circunstâncias exigem que seja mudado) pode ser usado para impetrar uma ação de habeas data

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